A responsabilidade das mulheres na Igreja | Palavra do Fundador - Novembro

Este mês de novembro dá-nos a oportunidade de Celebrar a Festa de Todos os Santos, e gostaríamos de honrar entre eles os testemunhos e as muitas figuras

das santas mulheres que desempenharam um papel eficaz e precioso na difusão do Evangelho. Juntamente com a Igreja, damos graças pelos numerosos frutos da

santidade feminina.

Mas, para além das ações femininas, é bom e necessário, descobrir que existe um mistério da mulher, uma beleza, uma dignidade, uma genialidade que possui a marca original de Deus. É por isso que podemos compreender, na cultura bíblica a responsabilidade do homem que é visto como o guardião da casa, da comunidade e da cidade; e a responsabilidade da mulher, como guardiã da alma e do lar, da beleza e da pureza (cf. Pr 31, 10-31).

Neste sentido bíblico pode se dizer que se o homem é pastor, a mulher é profeta e ambos são criados para se complementarem mutuamente. "A mulher é inseparável do homem e o homem da mulher, diante do Senhor. Pois, se a mulher foi tirada do homem, o homem nasce da mulher, e tudo vem de Deus" (1Cor 11, 11-12).

Este gênio feminino, como vocação para o amor e reflexo da beleza de Deus, vem precisamente da sua interioridade espiritual, que lhes permite ver com o coração e as convida à escuta e à oração. Desta forma, ela tem a graça de humanizar as correntes de pensamento dos homens, que demasiadas vezes tendem a organizar-se de acordo com os únicos critérios de eficiência e produtividade. Constatamos evidentemente que cada vez que um acontecimento importante tem lugar na vida de Jesus e nos Evangelhos, uma mulher está presente. Ela tem um papel inegável como testemunha e mensageira do mistério.

A Virgem Maria, inspiradora e modelo para todas as vocações femininas

Certamente, a Virgem Maria é a primeira nesse imenso cortejo da comunhão dos santos. Ela que proclamou na presença da sua prima Isabel "todas as gerações me chamarão de bem-aventurada" (Lc 1, 48). A sua cooperação é especificamente feminina, assim como o seu engajamento na obra de salvação a partir da Anunciação. Foi também ela que "movida de compaixão, levou Jesus Messias a dar inicio aos Seus milagres"1. "A Igreja vê, em Maria, a máxima expressão do 'gênio feminino' e encontra nela uma fonte incessante de inspiracao."2

Não há dúvida de que a Virgem Maria inspirou imensamente muitas mulheres de Israel a segui-la. Como a mulher que derramou óleo sobre a cabeça de Jesus antes da Sua Paixão: "Em verdade vos digo que, onde quer que venha a ser proclamado o Evangelho, em todo o mundo, também o que ela fez será contado em sua memória" (cf. Mt 26, 13; Mc 14, 9).

Os Evangelhos descrevem claramente as mulheres

que seguiram Jesus para ajudá-lo com seus bens. São Lucas especifica: "Maria Madalena, Joana, Susana e muitas outras" (cf. Lc 8, 2-3). Os Evangelhos também sublinham a presença fiel das mulheres junto de Jesus na hora da Sua Paixão (cf. Mt 27, 56.61; Mc 15, 40).

Entre elas, Maria Madalena, que foi também a primeira a testemunhar e anunciar o Ressuscitado (Jo 20, 1.11-18). Ela foi descrita por Santo Tomás de Aquino como "Apostola dos apóstolos". Em 2016, o Papa Francisco elevou a festa de Santa Maria Madalena a uma festa litúrgica, confirmando-a agora no novo prefácio da Missa como "Apostola dos apóstolos".

Muitas mulheres foram também escolhidas e chamadas por Jesus para serem suas discípulas. Outras foram curadas, libertadas, salvas por se colocarem no seu caminho: a mulher samaritana (cf. Jo 4, 1-39), a mulher sírio-fenícia (cf. Mc 7, 24-30), a hemorroíssa (cf. Mt 9, 20-22) e a pecadora perdoada (cf. Lc 7, 36-50), a libertação da mulher curvada, num dia de sábado na sinagoga (cf. Lc 13,10-17), etc.

Devemos também mencionar a longa lista das colaboradoras do Apóstolo Paulo nomeadas nas suas cartas. Entre elas estão Priscilla, a esposa de Àquila, que Paulo conheceu em Corinto, e Febe, a diaconisa (diakonos) da Igreja em Cencreas, uma pequena cidade a leste de Corinto (cf. Rm 16,1-2).

Muitas mulheres santas tiveram um papel importante na Igreja em todos os séculos do Cristianismo.

Jesus afirma a emancipação do poder masculino quando responde aos fariseus que um homem não tem o direito de se divorciar da sua esposa (cf. Mt 19, 7-9), o que significa que ele não pode dispor dela como bem desejar.

Mais próximo de nós, após o Concílio Vaticano II, o Papa Paulo VI conferiu o título de "Doutoras da Igreja" a Santa Teresa de Jesus (em setembro de 1970) e a Santa Catarina de Sena (em outubro de 1970). Depois o Papa São João Paulo II declarou Santa Teresinha do Menino Jesus como Doutora da Igreja (em outubro de 1997).

A vocação das mulheres: É a vocação ao amor, segundo o plano de Deus

A liberação das mulheres, o reconhecimento dos seus direitos e da sua igual dignidade à dos homens, a valorização do seu mistério e da sua própria genialidade não são questões novas.

"Relativamente a esta grande, imensa 'tradição' feminina, a humanidade tem uma divida incalculavel."3

Assim disse João Paulo II na sua Carta Apostólica sobre a Dignidade da Mulher de 1998: "Existem, por conseguinte, muitas razoes para ver nestes dois caminhos

diversos — duas vocações diversas de vida da mulher — uma profunda complementaridade"4. A vocação da mulher, o plano de Deus para ela, é a vocação ao amor. É ser a imagem do Amor de Deus, no dom de si mesma aos outros. Quantas mulheres em todos os continentes se doam, muitas vezes

sacrificando-se pelas suas famílias e sofrendo como mães, esposas e irmãs.

O Apóstolo Paulo recomenda ao seu discípulo Timóteo que trate "às senhoras, como a mães; às moças, como a irmãs, com toda pureza" (1 Tm 5, 2).

Existe uma complementaridade notável entre estas duas "vocações para a vida": a das esposas e mães e a das que se consagram à fecundidade espiritual.

Nestes dois mistérios de chamado, pode se contemplar o mistério da paternidade de Deus, de quem provém toda a paternidade e maternidade humana (cf. Ef 3, 14-15). Também a esses dois chamados cabe o serviço ao plano do Amor divino por cada criatura, amada em seu Filho.

A mulher consagrada tem também uma missão profética específica, como nos recorda também São João Paulo II5. De fato, se a mulher, de uma maneira geral, é a imagem da Igreja-esposa e mãe, a mulher consagrada simboliza mais precisamente a Igreja-esposa celeste, comunidade consagrada, povo escolhido, posto à parte para Deus e realização escatológica para a qual toda a Igreja tende.

Papa João Paulo II, na sua Exortação Apostólica "Vita Consecrata", escreve:

 "A historia da vida consagrada sempre produziu frutos abundantes mesmo em favor da sociedade. Pelos seus carismas, as pessoas consagradas tornam-se um sinal do Espirito em ordem a um futuro novo, iluminado pela fe e pela esperança crista. A tensão escatológica transforma-se em missão, para que o Reino se afirme de modo crescente, aqui e agora. A suplica 'Vem, Senhor Jesus!', une-se a outra invocação: 'Venha a nos o teu Reino!'(cf. Mt 6, 10)"6.

Mas é sempre em Maria, Filha-Virgem-Mãe-Esposa, que a vocação da mulher se exprime plenamente. Através da sua virgindade, ela é a imagem da pureza inalterável de Deus; através da sua maternidade, ela é a imagem da fecundidade criativa de Deus.

"Maria não é uma mulher diferente, uma mulher 'super-humana'. Pelo contrário, ela e a mulher restaurada na sua plenitude de humanidade."7 Em Maria, encontramos este modelo de interioridade espiritual fecunda, porque, como "serva do Senhor", ela está na aceitação dos outros e no dom de si mesma. Também está continuamente num serviço de amor "pelas 'grandes obras de Deus' que na história das gerações humanas nela e por seu meio se realizaram. Em última análise, não foi nela e por seu meio que se operou o que há de maior na história do homem sobre a terra: o evento pelo qual Deus mesmo se fez homem?"8.

 

Que feminismo para hoje e amanhã?

Parece-nos que a condição feminina não será realizada numa busca de comparação, nem de competição, nem na tentação de seguir modelos masculinos. Trata-se antes de viver e promover um "novo feminismo" que saiba traduzir o gênio feminino em todas as manifestações possíveis da Igreja e da sociedade, apaziguando e superando toda a discriminação, violência e dominação.

Da mesma forma que não se pode ver a contribuição dos homens para a vida da Igreja apenas em termos do único ministério sacerdotal, ignorando todas as outras formas de serviço masculino na Igreja. Não se pode e nem se deve centrar a atenção apenas no acesso das mulheres à ordenação, como se este fosse o único caminho para tornar o seu papel na Igreja mais presente e eficaz.

Geralmente, quando os cristãos querem denunciar a inferioridade da mulher e defender a afirmação fundamental da igualdade entre homens e mulheres, eles se apoiam frequentemente no texto de Paulo: "Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher; pois todos vós sois um só em Cristo Jesus."(Gl 3, 28)

A opinião comum pensa frequentemente infelizmente que a Igreja e a fé judaico-cristã são responsáveis pelos costumes machistas na nossa sociedade atual, por causa da sua origem patriarcal.

Pelo contrário, devemos esta libertação da condição feminina à obra redentora de Cristo, porque segundo a história da queda, o castigo pelo pecado foi a subordinação da mulher ao poder dominante do marido (cf. Gn 3, 16).

Na verdade, todos os batizados, homens e mulheres, recebem de Cristo uma filiação divina na qual todas as discriminações desaparecem. Já não existe a distinção entre escravos e homens livres, entre homens e mulheres. Esta reconciliação em Cristo conseguiu abolir todos os privilégios que favoreciam uma categoria em detrimento da outra.

 A mulher, tal como o homem, é libertada do pecado; e em Cristo, recebe e vive uma reorientação do seu desejo. Este é o significado do diálogo de Jesus com a mulher samaritana, e da pecadora perdoada "porque ela demonstrou muito amor" (cf. Lc 7,47).

A dimensão profética da mulher já mencionada acima é iluminada e encontra o seu significado. Profecia que consiste em criar beleza e harmonia feminina de acordo com Cristo. A vocação ao amor e constitutiva do gênio feminino.

Por fim, note-se que Paulo admitiu o direito das mulheres de rezar em público e a "profetizar" nas assembleias cristãs. Isto já era uma revolução nas primeiras comunidades (cf. 1 Cor 11, 5). O Apóstolo compreendeu a novidade do Cristianismo e instituiu o estado fundamental da igualdade.

Mas Cristo não quis esta igualdade na uniformidade (entre masculino e feminino), mas na diferença e complementaridade com o homem. Esta diferença na igualdade exige que se reconheça na Igreja uma dupla face da "humanidade integral": o masculino e o feminino em comunhão.

Carismas femininos na Igreja

Papa João Paulo II, durante a sua viagem à França em 1981, declarou: "Se é verdade que a Igreja no sentido hierárquico e dirigida pelos sucessores dos Apóstolos, e certamente tanto mais verdade que, no sentido carismático, as mulheres a conduzem tanto quanto, e talvez até mais"9.

Precisamos ainda aprofundar o mistério da Igreja: "hierárquica e carismática", como disse o Cardeal Joseph Ratzinger: "como 'duas dimensões coessenciais da Igreja'"10.

Somos igualmente desafiados a descobrir as novas formas de criatividade profética, geniais da graça de ser mulher.

Na era pós-conciliar, a consciência da multiplicidade de carismas ajudou-nos a compreender que fora do ministério ordenado existem muitos carismas e ministérios que manifestam a vitalidade da Igreja e contribuem para o seu desenvolvimento. É louvável a proposta do Papa Francisco de acolher mulheres nos ministérios instituídos de leitorado e acolitado11.

O Papa Francisco salientou também o papel dos leigos (homens e mulheres), que ele considera verdadeiros protagonistas da proclamação do Evangelho: "Ninguém foi batizado sacerdote ou bispo. Fomos todos batizados leigos", diz ele. O Papa Francisco, que nomeou várias mulheres para cargos de responsabilidade na Igreja desde o início do seu pontificado, insiste na importância de uma presença que, não é apenas laica na Igreja de hoje, mas também feminina. "Rezemos para que, em virtude do batismo, os fiéis leigos, em especial as mulheres, participem mais nas instancias de responsabilidade da Igreja, sem cair em clericalismos que anulam o carisma laical", declara ele.

Agradecemos ao Senhor pela presença e ajuda das santas mulheres nas nossas vidas

Queremos fazer nossa, a gratidão e ação de graças do Papa João Paulo II, na sua Carta as Mulheres no dia 29 de junho de 1995, com este grande agradecimento:

"O obrigado ao Senhor pelo seu desígnio sobre a vocação e a missão da mulher no mundo, torna-se também um concreto e direto obrigado as mulheres, a cada mulher, por aquilo que ela representa na vida da humanidade.

Obrigado a ti, mulher-mãe, que te fazes ventre do ser humano na alegria e no sofrimento de uma experiência única, que te torna o sorriso de Deus pela criatura que e dada a luz, que te faz guia dos seus primeiros passos, amparo do seu crescimento, ponto de referência por todo o caminho da vida.

Obrigado a ti, mulher-esposa, que unes irrevogavelmente o teu destino ao de um homem, numa relação de reciproco dom, ao serviço da comunhão e da vida.

Obrigado a ti, mulher-filha e mulher-irmã, que levas ao núcleo familiar, e depois a inteira vida social, as riquezas da tua sensibilidade, da tua intuição, da tua generosidade e da tua constância.

Obrigado a ti, mulher-trabalhadora, empenhada em todos os âmbitos da vida social, econômica, cultural, artística, politica, pela contribuição indispensável que das a elaboração de uma cultura capaz de conjugar razão e sentimento, a uma concepção da vida sempre aberta ao sentido do 'mistério', a edificação de estruturas econômicas e políticas mais ricas de humanidade.

Obrigado a ti, mulher-consagrada, que a exemplo da maior de todas as mulheres, a Mae de Cristo, Verbo Encarnado, te abres com docilidade e fidelidade ao amor de Deus, ajudando a Igreja e a humanidade inteira a viver para com Deus uma resposta 'esponsal', que exprime maravilhosamente a comunhão que Ele quer estabelecer com a sua criatura.

Obrigado a ti, mulher, pelo simples fato de seres mulher! Com a percepção que e própria da tua feminilidade, enriqueces a compreensão do mundo e contribuis para a verdade plena das relações humanas." E o Papa acrescenta: "Relativamente a esta grande e imensa 'tradição' feminina, a humanidade tem uma divida incalculavel"12.

"Mas agradecer não basta, já sei. Infelizmente, somos herdeiros de uma história com imensos condicionalismos que, em todos os tempos e latitudes, tornaram difícil o caminho da mulher, ignorada na sua dignidade, deturpada nas suas prerrogativas, não raro marginalizada e, ate mesmo, reduzida a escravidão. Isto impediu-a de ser profundamente ela mesma, e empobreceu a humanidade inteira de autenticas riquezas espirituais."13

São João Paulo II denuncia na sua carta: "uma cultura de permissivíssimo hedonista, na qual prosperam facilmente também, tendências de machismo agressivo"14. "Mas, se nisto tiveram responsabilidades objetivas, mesmo não poucos filhos da Igreja, especialmente em determinados contextos históricos, lamento-o sinceramente."15.

Concluamos esta meditação com uma nota de humor e de santidade desconcertante, através de uma das humildes servas do Senhor: Santa Bernadette Soubirous.

A jovem Bernadette, que tinha apenas 14 anos em 1858, na altura das aparições de Nossa Senhora de Lourdes, teve de dar conta da sua experiência das aparições ao seu pároco, que lhe disse: "Não podes imaginar que vais me fazer acreditar no que estas dizendo!". E Bernadette, bem inspirada, respondeu: "A Senhora pediu-me para vos dizer, não para vos fazer acreditar!".

 Reze com o salmo:

"Meu coração transborda

num belo poema, eu dedico

a minha obra a um Rei,

minha língua é a pena de

um escriba habilidoso.

És o mais belo dos filhos dos

homens, a graça escorre dos

Teus lábios, porque Deus

Te abençoa para sempre.

Cinge a Tua espada sobre

a coxa, ó valente, com

majestade e esplendor;

vai, cavalga pela

causa da verdade, da

pobreza e da justiça.

Tendes a corda do

arco, tornando terrível

a Tua direita!

Tuas flechas são agudas, os

povos submetem-se a Ti,

os inimigos do Rei

perdem a coragem.

Teu trono é de Deus, para

sempre e eternamente!

O cetro do Teu reino

é cetro de retidão!

Amas a justiça e odeias a

impiedade. Eis por que

Deus, o teu Deus, te ungiu

com o óleo da alegria, como

a nenhum dos teus rivais;

mirra e aloés perfumam

tuas vestes.

Nos palácios de marfim, o

som das cordas te alegra.

Entre as tuas amadas estão

as filhas do rei;

à tua direita uma dama,

ornada com ouro de Ofir.

Ouve, ó filha, vê e inclina teu

ouvido:

esquece o teu povo e a casa

do teu pai, que o Rei se

apaixone por tua beleza:

prostra-te à Sua frente,

pois Ele é o teu Senhor!

A filha de Tiro alegrará teu

rosto com seus presentes, e os

povos mais ricos com muitas

jóias cravejadas de ouro.

Vestida com brocados,

a filha do Rei é levada

para dentro, até o Rei,

com séquito de virgens.

Introduzem as companheiras

a ela destinadas, e com

júbilo e alegria elas

entram no palácio.

Em lugar de teus pais

virão teus filhos, e os farás

príncipes sobre a terra toda.

Vou comemorar teu nome de

geração em geração,

e os povos te louvarão para

sempre e eternamente."