Unidos na Misericórdia e pela Misericórdia!| Palavra do fundador - Julho 2023

 

Este mês de julho é particularmente acompanhado pelas festas de santos que são grandes intercessores para obter graças de unidade e misericórdia: São Bento (11 de julho); Santos Joaquim e Ana (26 de julho); Santos Maria, Marta e Lázaro de Betânia (29 de julho).

Os membros da Comunidade Sementes do Verbo associarão facilmente esta formação e o programa do Festival anual das Famílias que acontece todos os anos em julho. Também se recordarão da data da fundação da Comunidade em Palmas: 16 de julho.

Meditaremos o tema deste mês com a preciosa ajuda de São João Paulo II e sua Carta Encíclica Ut Unum Sint (“Para que sejam Um”). Esta carta é destinada ao engajamento ecumênico e às relações entre as várias confissões cristãs, razão pela qual, neste ano marcado pelo caminho sinodal, quis citar este documento como base teológica para nossa formação mensal. Também quis tomá-la como base de unidade para nossas comunidades fraternas numa perspectiva de vida conjugal e familiar, partindo dos princípios essenciais do Magistério de São João Paulo II.

Unidos na esteira dos mártires, os crentes em Cristo não podem permanecer divididos. Se querem verdadeira e eficazmente fazer frente à tendência do mundo a tornar vão o Mistério da Redenção, os cristãos devem professar juntos a mesma verdade sobre a Cruz.” ¹

Um em tua mão (Ez 37, 17)

O profeta Ezequiel (século VI a.C.) no contexto da deportação dos israelitas para a Babilônia sob o reinado do rei Nabucodonosor) apresenta sua mensagem utilizando uma imagem pedagógica: a de dois pedaços de madeira (na mão de Deus), para traduzir a vontade divina de unir os dois povos, Israel e Judá, a fim de fazer deles um único povo.

“E tu, filho do homem, toma um pedaço de lenha e escreve sobre ela: ‘Judá e os filhos de Israel que estão com ele’. Em seguida tomarás outro pedaço de lenha e escreverás sobre ela: ‘José (pedaço de Efraim) e toda a casa de Israel que está com ele’. Aproxima-os um da outro, de modo que formem um só pedaço de lenha; que eles formem um só na tua mão. Ora, quando os filhos do teu povo te perguntarem: ‘Não nos explicarás o que queres dizer com isto?’ Tu lhes dirás: Assim diz o Senhor: Eu vou tomar o pedaço de lenha que é José (a qual está na mão de Efraim), e as tribos de Israel que estão com ele, e os juntarei ao pedaço de lenha que é Judá, e farei deles um só pedaço de lenha, de modo que sejam um só pedaço em minha mão. Os pedaços de lenha sobre as quais escreveste estarão em tua mão diante dos seus olhos. Dize-lhes: Assim diz o Senhor: Eis que vou tomar os filhos de Israel dentre as nações, para as quais foram levados, e reuni-los-ei de todos os povos e os reconduzirei para a sua terra, e farei deles uma só nação na terra, nos montes de Israel, e haverá um só rei para todos eles. Já não constituirão duas nações, nem tornarão a dividir-se em dois reinos. Não voltarão a contaminar-se com os seus ídolos imundos, com as suas abominações e com todas as suas transgressões. Hei de salvá-los das suas apostasias com que pecaram e hei de purificá-los, para que sejam o meu povo e eu seja o seu Deus. O meu servo Davi será rei sobre eles, e haverá um só pastor para todos, e andarão de acordo com as minhas normas e guardarão os meus estatutos e os praticarão. Habitarão na terra que dei ao meu servo Jacó, terra em que habitaram os vossos pais. Nela habitarão eles, os seus filhos e os filhos dos seus filhos para sempre, e Davi, o meu servo, será o seu príncipe para sempre. Concluirei com eles uma aliança de paz, a qual será uma aliança eterna. Estabelecê-los-ei e os multiplicarei, e porei o meu santuário no meio deles para sempre. A minha Habitação estará no meio deles: eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo. Assim saberão as nações que eu sou Iahweh, aquele que santifica Israel, quando o meu santuário estiver no meio deles para sempre.” (Ez 37, 16-28)

O Papa Bento XVI, comentando este texto de Ezequiel, afirma: “Na dispersão entre os povos, os Israelitas tinham conhecido cultos errôneos, amadurecido concepções de vida erradas e assumido costumes alheios à lei divina. [...] E o texto profético conclui-se com a promessa definitiva e plenamente salvífica: ‘Concluirei com eles uma aliança de paz... porei o meu santuário no meio deles para sempre’ (Ez 37, 26) [...] Também nós devemos estar abertos a esta renovação, porque aprendemos costumes muito afastados da Palavra de Deus. ‘Como toda a renovação na Igreja [...] consiste essencialmente numa crescente fidelidade à sua vocação, este é, sem dúvida, o motivo do movimento para a unidade’, isto é, a maior fidelidade à vocação de Deus.” ²

As tentações de fuga, de defesa, de recusa, de autojustificação e de autopreservação, contaminadas pelo modo predominante de nossa geração, fazem parte dos múltiplos obstáculos contra a unidade e contra a misericórdia entre nós, quer seja em situações de vida conjugal e familiar, quer seja em situações de vida fraterna e comunitária. Entretanto, se existem doenças ou parasitas que afetam a unidade e a misericórdia, existem também remédios que nos ajudam a voltar ao caminho dessas graças. O Papa Francisco deixa isso claro ao dizer: “Fundamentalmente, as atitudes de oração, penitência e adoração, são verdadeiros remédios espirituais, que nos permitirão experimentar novamente que ser cristão é saber que se é abençoado e, portanto, portador de felicidade para os outros.” ³

São João, melhor do que qualquer outro apóstolo e evangelista, contemplou na Paixão do Senhor a razão e a fonte de unidade entre os cristãos e coletou esta declaração do sumo sacerdote de Jerusalém:

Um deles, porém, Caifás, que era Sumo Sacerdote naquele ano, disse-lhes: ‘Vós de nada entendeis. Não compreendeis que é de vosso interesse que um só homem morra pelo povo e não pereça a nação toda?’ Não dizia isso por si mesmo, mas sendo Sumo Sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus iria morrer pela nação – e não só pela nação, mas também para congregar na unidade todos os filhos de Deus dispersos.” (Jo 11,49-52).

A imagem simbólica e profética de Ezequiel, dos dois pedaços de madeira reunidos, tornou-se um cumprimento de unidade na mão do Senhor. Unidade eterna, plenamente realizada no altar dos dois pedaços de madeira da Cruz de Cristo.

O serviço da unidade requer uma Escola de várias disciplinas

A oração (em casal e a oração dos irmãos)

Jesus, na hora de Sua Paixão, ofereceu Sua oração sacerdotal ao Pai:

A fim de que todos sejam um. Como Tu, Pai, estás em mim e eu em Ti, que eles estejam em nós, para que o mundo creia que Tu me enviaste.”(Jo 17, 21)

Se Jesus rezou desta maneira na véspera de Sua Paixão, isso significa que a unidade entre nós não pode ser alcançada fora da oração. A partir da oração se concebe que crer em Jesus significa crer na totalidade do conteúdo da fé, a fim de viver a unidade nessa mesma fé. Como declara o Papa São João Paulo II:

“[...] a Fonte da sua unidade que é Jesus Cristo. Ele ‘é sempre o mesmo ontem, hoje e por toda a eternidade’ (Hb 13, 8). Na comunhão de oração, Cristo está realmente presente; reza ‘em nós’, ‘conosco’ e ‘por nós’. É Ele que guia a nossa oração no Espírito Consolador, que prometeu e deu à Sua Igreja no Cenáculo de Jerusalém, quando a constituiu na Sua unidade original. 4

Quando realmente começamos a rezar uns pelos outros, o Senhor é, de fato, acolhido para fazer o Seu trabalho de abertura do coração. Isso acontece também no casal: o marido reza por sua esposa e reciprocamente. Então, o Senhor está como que “autorizado” a fazer Seu trabalho pedagógico, para nos conduzir finalmente a um verdadeiro caminho de reconciliação e de unidade.

Em verdade ainda vos digo: se dois de vós estiverem de acordo na terra sobre qualquer coisa que queiram pedir, isso lhes será concedido por meu Pai que está nos céus. Pois onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles.” (Mt 18, 19-20)

Em sua Encíclica sobre a Unidade dos Cristãos, São João Paulo II insiste no fundamento da oração em todo percurso ecumênico, fundamento que também podemos utilizar como base para o serviço da unidade conjugal:

“No caminho ecumênico para a unidade, a primazia pertence, sem dúvida, à oração comum, à união orante daqueles que se congregam à volta do próprio Cristo. Se os cristãos, apesar das suas divisões, souberem unir-se cada vez mais em oração comum ao redor de Cristo, crescerá a sua consciência de como é reduzido o que os divide em comparação com aquilo que os une.”5

O amor (conjugal e fraternal)

Se não há amor, como poderá surgir o desejo de unidade e algum desejo de arrependimento? São João Paulo II descreve do seguinte modo:

Do amor nasce o desejo de unidade, mesmo naqueles que sempre ignoraram tal exigência. O amor é artífice de comunhão entre as pessoas e entre as Comunidades. Se nos amamos, tendemos a aprofundar a nossa comunhão, a orientá-la para a perfeição. O amor é dedicado a Deus como fonte perfeita de comunhão – a unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo –, para dela haurir a força de suscitar a comunhão entre as pessoas e as Comunidades, ou de a restabelecer entre os cristãos ainda divididos. O amor é a corrente mais profunda que dá vida e infunde vigor ao processo que leva à unidade.” 6

A penitência

A falta de misericórdia e a recusa em perdoar e pedir perdão atrasa a unidade entre irmãos em Cristo. A oração abre os corações à conversão.

Em seguida, a conversão dos corações é necessária para permitir entrar num processo de arrependimento e penitência, para reler as circunstâncias do passado à luz da misericórdia divina.

A própria conversão interior do coração, condição essencial de toda a autêntica procura da unidade, deriva da oração e por ela é orientada para a sua perfeição.” 7

Os discípulos do Senhor, animados pelo amor, pela coragem da verdade e pela vontade sincera de se perdoarem mutuamente e se reconciliarem, são chamados, com a graça do Espírito Santo, a reconsiderarem juntos o seu doloroso passado e aquelas feridas que este, infelizmente, continua ainda hoje a provocar.[...] ” 8

A Igreja Católica reconhece e confessa as fraquezas dos seus filhos, consciente de que os seus pecados constituem igualmente traições e obstáculos à realização dos desígnios do Salvador. Sentindo-se constantemente chamada à renovação evangélica, ela não cessa de fazer penitência.” 9

A adoração

O exercício da oração adoradora é, se assim se pode dizer, a forma de oração mais gratuita que existe. Diante do Santíssimo Sacramento exposto no altar, as barreiras mais enraizadas e resistentes dos corações são derrubadas, as armas mais terríveis caem por terra, as impurezas mais persistentes são lavadas pelo sangue do Cordeiro de Deus.

Precisamos de oração, penitência e adoração que nos permitam dizer como o publicano: ‘Meu Deus, tem piedade de mim, porque sou pecador!’ (Lc 18,13); não como uma atitude puritana, infantil ou tímida, mas com a coragem de abrir a porta e ver o que normalmente é velado pela superficialidade, a cultura do bem-estar e da aparência.” 10

Oremos neste sentido, com a oração do Patriarca Athenágoras (1886-1972), que foi Patriarca de Constantinopla e que o Papa São Paulo VI reencontrou durante sua peregrinação à Terra Santa em 1964:

A guerra mais dura é a guerra contra si mesmo. Você tem que ser capaz de se desarmar. Lutei nessa guerra durante anos, foi terrível. Mas agora eu estou desarmado. Eu não tenho mais medo de nada, porque o amor expulsa o medo. Estou desarmado da vontade de ter razão, de me justificar, desqualificando os outros. Não estou mais em guarda, zelosamente tenso em minhas riquezas. Eu acolho e compartilho. Eu particularmente não me importo com minhas ideias, meus projetos. Se alguém me presentear com melhores, ou melhor, não melhores, mas boas, eu aceito sem arrependimento. Eu renuncio à comparação. O que é bom, verdadeiro, real, é sempre o melhor para mim. É por isso que eu não tenho mais medo. Quando não temos mais nada, não temos mais medo. Se nos desarmarmos, se nos despojarmos Se nos abrirmos ao Amor que faz novas todas as coisas, Então o Amor apagará o passado ruim E nos dará um novo tempo onde tudo é possível.” (Patriarca Athenágoras)

O diálogo

O diálogo se baseia na oração, pois é a partir da oração que se recebe a inspiração e a aspiração ao diálogo com o outro, com os outros. Pode-se dizer que a oração continua no diálogo. Ele é, segundo São João Paulo II, “uma passagem obrigatória” como uma reciprocidade de “troca de dons”. “O diálogo é passagem obrigatória do caminho a percorrer para a plenitude do homem, tanto do indivíduo como de cada comunidade humana.” 11

Para que um diálogo seja fecundo, algumas condições devem ser consideradas: “É preciso passar de uma posição de antagonismo e de conflito para um nível onde um e outro se reconheçam reciprocamente como parceiro. Quando se começa a dialogar, cada uma das partes deve pressupor uma vontade de reconciliação no seu interlocutor, de unidade na verdade. Para realizar tudo isso, devem desaparecer as manifestações de hostilidade recíproca. Somente assim o diálogo ajudará a superar a divisão e poderá aproximar da unidade.” 12

Pois o próprio diálogo em si, se deve ser um “diálogo das consciências”, imediatamente nos chama a fazer um exame de consciência pessoal. Assim, as palavras da primeira carta de João são claras e são um teste de consciência para nos fazer reconhecer nossa condição de pecadores:

Se dissermos: ‘Não temos pecado’, enganamo-nos a nós mesmos e a verdade não está em nós. Se confessarmos nossos pecados, ele, que é fiel e justo, perdoará nossos pecados e nos purificará de toda injustiça. Se dissermos: ‘Não pecamos’, fazemos dele um mentiroso, e a sua palavra não está em nós.” (1Jo 1, 8-10)

São João Paulo II sublinha isto dizendo:

[...] a unidade dos cristãos é possível com a condição de estarmos humildemente conscientes de ter pecado contra a unidade, e convencidos da necessidade da nossa conversão. Não só os pecados pessoais devem ser perdoados e vencidos, mas também os sociais, quer dizer, as próprias ‘estruturas’ do pecado, que contribuíram e podem contribuir para a divisão e sua consolidação.” 13

Somente através destas duas dimensões: vertical (no reconhecimento mútuo de nossa condição de homens e mulheres pecadores orientados a Deus e à reconciliação) e horizontal (no intercâmbio humano de opiniões e dons), o diálogo pode tornar-se um “autêntico ‘diálogo da salvação’ ”.14

O amor à verdade

Esta dimensão também é essencial, especialmente para penetrar nas dificuldades objetivas e tornar-nos capazes de nomeá-las. Este amor é possível quando se dá graças à ajuda do Espírito Santo, a quem São João chama de “Espírito da Verdade” (cf. Jo 14, 17; Jo 16, 13).

Há-de ser, portanto, evitada absolutamente toda a forma de reducionismo ou de fácil ‘concordismo’. As questões sérias têm de ser resolvidas, porque, caso contrário, ressurgirão noutro momento, com idêntica configuração ou sob outra roupagem.” 15

O amor à verdade é a dimensão mais profunda de uma autêntica procura da plena comunhão entre os cristãos. Sem esse amor, seria impossível enfrentar as reais dificuldades teológicas, culturais, psicológicas e sociais que se encontram ao examinar as divergências. A esta dimensão interior e pessoal, está inseparavelmente associado o espírito de caridade e de humildade: caridade para com o interlocutor, humildade para com a verdade que se descobre e que poderia exigir revisão de afirmações e de atitudes.” 16

O olhar vivificado pela misericórdia divina

Enquanto persistir uma certa agressividade, um espírito de retaliação ou, ainda mais, um espírito de vingança, a situação de conflito será dificilmente transformada. Será então necessário trabalhar pacientemente para acolher a “lei nova” do Espírito, que traz consigo a qualidade de uma caridade misericordiosa.

Ocorre um olhar de verdade sereno e límpido, vivificado pela misericórdia divina, capaz de libertar os ânimos e de suscitar em cada pessoa uma renovada disponibilidade em ordem ao anúncio mesmo do Evangelho aos homens de todos os povos e nações.” 17

[...]na sua infinita misericórdia, Deus pode tirar o bem até mesmo das situações que ofendem o Seu desígnio, podemos então descobrir que o Espírito fez com que as oposições servissem, em algumas circunstâncias, para explicitar aspectos da vocação cristã, como sucede na vida dos santos. Apesar da divisão, que é um mal de que nos devemos curar, todavia realizou-se como que uma comunicação da riqueza da graça, que está destinada a embelezar a koinônia: a graça de Deus estará com todos aqueles que, seguindo o exemplo dos santos, se esforçam por favorecer as suas exigências.” 18

O papel da unidade do Papa, sucessor de Pedro, a serviço da misericórdia divina

Se o apóstolo Pedro, o primeiro, foi marcado e formado de forma singular pela misericórdia divina, este fato não é inocente e marca, de maneira singular, a sucessão apostólica. Isto significa que cada papa, como sucessor de Pedro, recebe, à sua maneira e de acordo com seu tempo e seu povo, este traço particular da misericórdia divina. Sem dúvida, o Papa Francisco é marcado em seu ministério e magistério pela participação na misericórdia para o nosso tempo. Paradoxalmente, é talvez nesta dimensão de abertura e de reforma que ele é, às vezes criticado. Os ataques e alvos dos adversários da Igreja e dos cristãos dizem respeito, muitas vezes, aos ministérios e aos carismas. É por isso que é tão importante rezar pelo Papa e por nossos Bispos.

Ligado como está à tríplice profissão de amor de Pedro que corresponde à tríplice negação, o seu sucessor sabe que deve ser sinal de misericórdia. O seu ministério é um ministério de misericórdia, nascido de um ato de misericórdia de Cristo. Toda esta lição do Evangelho deve ser constantemente relida, para que o exercício do ministério petrino nada perca da sua autenticidade e transparência. A Igreja de Deus é chamada por Cristo a manifestar a um mundo fechado no emaranhado das suas culpas e dos seus sinistros propósitos, que, apesar de tudo, Deus, na sua misericórdia, pode converter os corações à unidade, fazendo-os aceder à sua própria comunhão.” 19

Este serviço da unidade, radicado na obra da misericórdia divina, está confiado, no seio mesmo do colégio dos Bispos, a um daqueles que receberam do Espírito o encargo, não de exercer o poder sobre o povo – como fazem os chefes das nações e os grandes (cf. Mt 20, 25; Mc 10, 42) –, mas de o guiar para que possa encontrar- se em pastagens tranquilas. Tal encargo pode exigir a oferta da própria vida (cf. Jo 10, 11-18). Depois deter mostrado como Cristo é ‘o único Pastor, na unidade do qual todos são um só’, Santo Agostinho exorta: ‘Estejam todos os pastores no único Pastor e proclamem a voz única do Pastor; ouçam as ovelhas esta voz e sigam o seu Pastor: não este ou aquele, mas o único Pastor. Apregoem todos com Ele uma só voz e não haja vozes diversas. [...] Ouçam as ovelhas esta voz, purificada de toda a divisão, livre de toda a heresia’.” 20

Finalmente, o Papa São João Paulo II conclui sua Carta sobre a Unidade, resumindo estas três recomendações que devemos tomar para nós, assim como para toda a Igreja, para nossas comunidades e para nossos casais e famílias:

[...] a Igreja pede ao Espírito a graça de reforçar a sua própria unidade e de a fazer crescer até à plena comunhão com os outros cristãos. Como consegui-lo? Em primeiro lugar, com a oração. A oração sempre deveria incluir aquela inquietação que é anelo pela unidade, e portanto uma das formas necessárias do amor que nutrimos por Cristo e pelo Pai, rico de misericórdia. A oração deve ter a prioridade neste caminho que empreendemos com os outros cristãos. Como consegui-lo? Com a ação de graças, porque não nos apresentamos a esse encontro de mãos vazias: ‘Mas o próprio Espírito vem em ajuda da nossa fraqueza (...) e intercede por nós com gemidos inefáveis’ (Rm 8, 26), para nos dispor a pedir a Deus aquilo de que temos necessidade.

Como consegui-lo? Com a esperança no Espírito, que sabe afastar de nós os espectros do passado e as recordações dolorosas da separação; Ele sabe conceder- nos lucidez, força e coragem para empreender os passos necessários, de modo que o nosso empenho seja cada vez mais autêntico. E se nos viesse a vontade de perguntar se tudo isto é possível, a resposta seria sempre: sim. A mesma resposta ouvida por Maria de Nazaré, porque a Deus nada é impossível. Voltam-me ao pensamento as palavras com que São Cipriano comenta o Pai Nosso, a oração de todos os cristãos: ‘Deus não aceita o sacrifício do que vive em discórdia, e manda-o retirar-se do altar para ir primeiro reconciliar-se com seu irmão, porque só as orações de um coração pacífico poderão obter a reconciliação com Deus. O sacrifício mais agradável a Deus é a nossa paz e a concórdia fraterna, e um povo cuja união seja um reflexo da unidade que existe entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo’.” 21

Que neste ano sinodal, o Senhor guarde a Igreja na paz e na unidade! Assim cada uma de nossas comunidades, bem como cada família humana e nossas famílias.

Referências:

1 Papa São João Paulo II, Carta Encíclica Ut Unum Sint (1995), n. 1.

2 Papa Bento XVI, Audiência Geral, 21 de janeiro de 2009.

3 Papa Francisco, Carta ao povo da Alemanha, 29 de junho de 2019.

4 Papa São João Paulo II, Carta Encíclica Ut Unum Sint (1995), n. 22

5 Papa São João Paulo II, Carta Encíclica Ut Unum Sint (1995), n. 22.

6 Ibidem, n. 21.

7 Ibidem, n. 26.

8 Ibidem, n. 2.

9 Ibidem, n.3.

10 Papa Francisco, Carta ao povo da Alemanha, 29 de junho de 2019.

11 Papa São João Paulo II, Carta Encíclica Ut Unum Sint (1995), n. 28.

12 Papa São João Paulo II, Carta Encíclica Ut Unum Sint (1995), n. 29.

13 Ibidem, n. 34.

14 Paulo VI, na Carta Encíclica Ecclesiam Suam, n. 42ss. Citado por Papa São João Paulo II, Carta Encíclica Ut Unum Sint (1995), n. 35.

15 Papa São João Paulo II, Carta Encíclica Ut Unum Sint (1995), n. 36. 16 Ibidem

17 Papa São João Paulo II, Carta Encíclica Ut Unum Sint (1995), n. 2. 18 Ibidem, n. 85.

19 Ibidem, n. 93.

20 Papa São João Paulo II, Carta Encíclica Ut Unum Sint (1995), n. 94.

21 Ibidem, n. 102.