A serviço da Beleza, a caminho com Maria | Palavra do fundador - Agosto 2023

 

A fórmula latina “via pulchritudinis” significa “o caminho da Beleza”. Este caminho da Beleza é um caminho de evangelização das culturas, de diálogo com outras religiões e com os não-crentes, para levar a Cristo “Caminho, Verdade e Vida” (Jo 14, 6). De fato, ao longo de toda a história do Cristianismo, a beleza tem sido um poderoso fator de evangelização e de catequese.

Hoje, mais do que nunca, os homens e as mulheres de nossas sociedades procuram encontrar a beleza na variedade das artes, através da arquitetura, da música, da teatro, da cinema, da pintura, da escultura... Da arte bizantina à arte românica, da arte gótica à Renascença, da arte barroca à arte moderna.

Em nossos dias, não seria importante oferecer aos nossos contemporâneos um serviço de beleza começando, por exemplo, pelo cuidado em preparar belas liturgias?

Como o Cardeal Joseph Ratzinger, de maneira tão luminosa, disse: “É certo que a força interna da liturgia desempenhou um papel essencial na difusão do cristianismo [...] O que é impressionante é o mistério, o mistério como tal, um mistério que, precisamente porque está além de qualquer discussão, impõe à razão a força da verdade.” ¹

Infelizmente, no momento atual, é muito comum encontrar uma cultura de mediocridade e de transgressão, muitas vezes chegando ao ponto da provocação. É o que reconhece o historiador francês René Rémond: “A cultura marcada por uma visão materialista e ateísta característica das sociedades secularizadas, suscita uma verdadeira insatisfação e às vezes, uma acusação da religião, em particular do cristianismo, e incluindo um novo anti-catolicismo.” ²

Entretanto, esta busca da Beleza está ancorada nos anseios do homem e da humanidade desde o início dos tempos. É como se, desde a queda original, o homem procurasse desesperadamente um mundo de beleza que havia se tornado além de seu alcance. A questão da Beleza não estaria incluída na busca da Verdade? Como aquela que fez Pilatos perguntar: “O que é Verdade?” (Jo 18, 38). A beleza, como escreve São João Paulo II, é “o esplendor da verdade”. Portanto, a resposta deve ser a mesma: é o próprio Jesus que é a Beleza. Ele se manifesta do Tabor à Cruz, para iluminar o mistério do homem desfigurado pelo pecado, mas que foi purificado e recriado pelo Amor redentor. Beleza suprema, esplendor da verdade, Jesus é a fonte de toda beleza, porque, como o Verbo de Deus feito carne, Ele é a manifestação do Pai: “Quem me vê, vê o Pai” (Jo 14, 9).

O escritor judeu Max Jacob (1876-1944), que sofreu com os horrores do anti-semitismo nazista durante a Segunda Guerra Mundial (ele que perdeu um irmão e uma irmã em Auschwitz), se perguntava: “Não será a beleza o caminho mais seguro para o bem?”. ³

A via pulchritudinis brilha no rosto de Cristo “o resplendor de Sua glória e a efígie de Sua substância” (cf. Hb 1,3)

O Filho feito carne no ventre de Maria é chamado pelo salmista: “o mais belo dos filhos dos homens” (Sl 45, 3). Quanto à consciência que tem de si mesmo, Jesus é claro: “O Pai está em mim e eu no Pai” (Jo 10, 38).

Hoje, ressoa espiritualmente em nossos ouvidos o pedido dos peregrinos gregos, que haviam subido em peregrinação a Jerusalém por ocasião da Páscoa, ao apóstolo Felipe: “Queremos ver Jesus” (Jo 12, 21).

Estas duas palavras, sublinhadas pelo Evangelho, são suficientes: “Ecce homo”, “Eis o Homem” (Jo 19, 5). Desde a Encarnação e desde o ministério e Paixão de Cristo, os cristãos (católicos e ortodoxos) já não podem ser censurados de venerar as imagens como “ídolos”. Esperamos não ver mais reações iconoclásticas como aquelas que a Igreja experimentou nos séculos VIII e IX. O Senhor nos revelou o Seu rosto. O Senhor Adonai, que Moisés só podia ver pelas costas, agora se fez Homem e se deu a conhecer por aqueles que Nele depositaram sua confiança.

Em Cristo, Deus abençoou verdadeiramente todas as pessoas e para todas elas fez “resplandecer Seu rosto” (cf. Sl 67, 2).

O Santo Papa João Paulo II sublinha que a missão da Igreja é: “refletir a luz de Cristo em cada época da história, e por conseguinte fazer resplandecer o Seu rosto também diante das gerações do novo milênio”.4 Devemos nós mesmos, antes de tudo, contemplar Seu rosto.

A beleza é realmente uma graça a se contemplar, cuja fonte vem das Sagradas Escrituras, oferecendo aos fiéis a possibilidade da experiência viva de Cristo, o Verbo de Vida, que lhes permite “ver com os olhos, ouvir com os ouvidos, tocar com as mãos e contemplar...” (cf. 1Jo 1,1).

Quando Jesus é batizado por João Batista no Jordão, Ele está bem consciente de que é o “Filho Amado”, e é fortalecido pelo testemunho do alto (cf. Lc 3, 22). Então, ao longo de Seu ministério, as palavras e os sinais de graça e de misericórdia nunca deixam de transmitir a evidência dessa Beleza que vem da graça com a qual Ele é ungido.

Mas é o paradoxo de um rosto desfigurado que o Filho do Homem mostrará em Sua Paixão, insuportável para a maioria dos discípulos. Na Cruz de Seu sofrimento redentor, o rosto do Filho do Homem crucificado se revela como o cume e o arquétipo de toda beleza. É o modelo do Amor infinito de Deus que, em Sua Misericórdia para com toda a humanidade, restaura a beleza perdida pelo pecado original.

“Por amor, o ‘mais belo dos filhos dos homens’ (Sl 45, 3) tornou-se ‘o homem das dores’, ‘não tinha beleza nem esplendor que pudesse atrair o nosso olhar’ (Is 53, 2). E assim Ele devolveu ao homem, a cada homem, em plenitude Sua beleza, Sua dignidade e Sua verdadeira grandeza. Em Cristo, e somente Nele, nossa Via Crucis se transforma em Sua via lucis e via pulchritudinis.”5

Para transmitir ao homem o rosto do Pai, Jesus teve não apenas de assumir o rosto do homem, mas de tomar inclusivamente o ‘rosto’ do pecado: ‘Aquele que não havia conhecido pecado, Deus O fez pecado por nós para que nos tornássemos n’Ele justiça de Deus’ (2Cor 5, 21). Jamais acabaremos de sondar o abismo deste mistério.”6

No entanto, o Papa João Paulo II deixa claro: “O grito de Jesus na cruz, amados irmãos e irmãs, não traduz a angústia dum desesperado, mas a oração do Filho que, por amor, oferece a sua vida ao Pai pela salvação de todos.”7

Em seguida, é a face do Ressuscitado que o Filho de Deus revela, e agora é para Ele que os olhos da Igreja estão fitos: “Confortada por esta experiência revigoradora, a Igreja retoma agora o seu caminho para anunciar Cristo ao mundo[...]: Jesus Cristo ‘é o mesmo ontem, hoje e sempre (Hb 13, 8).”8

O rosto, que os Apóstolos contemplaram depois da ressurreição, era o mesmo daquele Jesus com quem tinham convivido cerca de três anos e que agora os convencia da verdade incrível da Sua nova vida, mostrando-lhes ‘as mãos e o lado’ (Jo 20, 20).”

Finalmente, é através do olhar da fé que se descobre a Beleza do rosto de Cristo, pois como diz o Papa São João Paulo II: “A Jesus só se chega verdadeiramente pelo caminho da fé”.

A via pulchritudinis se apresenta como um autêntico meio para a experiência da Fé que, por sua vez, abre o espírito humano para o Belo. É a fé que ajuda a descobrir a beleza do Evangelho de Cristo e que a Igreja tem por missão de anunciar.

A Beleza da Santíssima Trindade, do Deus de Amor, é a Fonte de toda beleza, de toda verdade e de toda bondade. O Belo, tanto quanto a Verdade ou o Bem, nos conduz a Deus, a Verdade primeira, o Bem Supremo e a Beleza infinita. Esta foi a experiência que Santo Agostinho fez quando exclamou:

Tarde Te amei, ó beleza tão antiga e tão nova! Tarde demais eu Te amei! Eis que habitavas dentro de mim e eu Te procurava do lado de fora! Eu, disforme, lançava-me sobre as belas formas das Tuas criaturas. Tu me chamaste, e Teu grito rompeu a minha surdez. Fulguraste e brilhaste e Tua luz afugentou a minha cegueira. Aspergiste Tua fragrância e, respirando-a, suspirei por ti. Eu te saboreei, e agora tenho fome e sede de ti. Tu me tocaste, e agora estou ardendo no desejo de Tua paz.”11

Com palavras doces e lisonjeiras seduzem os corações dos inocentes.” (Rm 16, 18)

O Apóstolo Paulo advertiu os cristãos de Roma quanto ao cuidado com as belezas enganosas, aquelas que visam a sedução e a manipulação das criaturas. Elas se revelam como falsas belezas, caricaturas da verdadeira beleza. Quando essas belezas sedutoras são habitadas e feridas pelo pecado, elas se revelam, num segundo tempo, como uma armadilha usada pelo tentador. O ídolo é confundido com o ícone, como denuncia o Documento do Pontifício Conselho para a Cultura:

Se a beleza é uma imagem do Deus Criador, é também a filha de Adão e Eva e em seu rastro marcada pelo pecado... um meio que engole o fim, uma verdade que aprisiona, uma armadilha na qual caem muitas pessoas, por falta de uma adequada formação da sensibilidade e de uma adequada educação na beleza.”12

É preciso estar ciente de que existe (tanto hoje como no passado) um “culto artístico idolátrico”. Tudo o que pode ser considerado como expressões de sucesso, de genialidade e de certas criatividades livres, muitas vezes são apenas expressões do culto do “eu”, mostrando estátuas que se assemelham apenas a seus autores, e que não nos elevam a nenhuma transcendência. Infelizmente, esse tipo de arte pode ser encontrado até mesmo nas igrejas, o que chamaríamos como “arte sacra” ou “arte religiosa”.

Assim, Isaías lamenta e profetiza uma beleza decaída, o que provocou a busca e a meditação de vários padres da Igreja: “O teu fausto foi precipitado no Xeol, juntamente com a música das tuas harpas. Sob o teu corpo os vermes formam como um colchão, os bichos te cobrem como um cobertor. Como caíste do céu, ó estrela d’alva, filho da aurora! Como foste atirado à terra, vencedor das nações! E, no entanto, dizias no teu coração: ‘Hei de subir até o céu, acima das estrelas de Deus colocarei o meu trono, estabelecer-me-ei na montanha da assembleia, nos confins do norte. Subirei acima das nuvens, tornar-me-ei semelhante ao Altíssimo. E, contudo, foste precipitado ao Xeol, nas profundezas do abismo.” (Is 14, 11-15)

No encerramento do Concílio Ecumênico Vaticano II, o Santo Padre Paulo VI, em sua Mensagem aos Artistas de 08 de dezembro de 1965, declarou: “O mundo em que vivemos tem necessidade de beleza para não cair no desespero. A beleza, como a verdade, é a que traz alegria ao coração dos homens, é este fruto precioso que resiste ao passar do tempo, que une as gerações e as faz comungar na admiração.”

Deus é chamado pelo autor do livro da Sabedoria: “A fonte da Beleza” (Sb 13, 3).

A contemplação da criação e das belezas que ela contém traz a paz interior e provoca um desejo pelo que é harmonioso, pelo que é ordenado e que encanta o coração. A todo momento, os cristãos são convidados a buscar e promover a diaconia e a cultura da Beleza: na Liturgia, no louvor e na ação de graças, na adoração, nas procissões... para cantar com o salmista: “Quando vejo o céu, obra dos Teus dedos, a lua e as estrelas que fixaste, que é o homem, para dele Te lembrares, e um filho de Adão, para que venhas visitá-lo? E o fizeste pouco menos do que um deus, coroando-o de glória e beleza. Para que domine as obras de Tuas mãos sob seus pés tudo colocaste. [...] Ó Senhor nosso, quão poderoso é Teu nome em toda a terra!” (Sl 8,4-7.10)

As famosas palavras do escritor russo do século XIX Fyodor Dostoyevsky (1821-1881): “A beleza salvará o mundo” permanecem sempre atuais, porque para nós que temos fé esta beleza é o Cristo, a beleza única que foi desfigurada na cruz, e que resgatou o mundo no brilho da Sua Ressurreição.

A Teologia dos ícones e da arte sacra

Sem um conhecimento aprofundado dos “sagrados mistérios”, bem como de um suficiente conhecimento de Patrística, podemos ter uma certa dificuldade para analisar em profundidade os fundamentos da Liturgia e da Arte Sacra, devido à carência de fontes.

O Senhor disse a Moisés: “Minha face, porém, não se pode ver” (Ex 33, 23). Nestas condições, é de fato proibido reproduzir qualquer forma de imagem, gravada ou esculpida, sob pena de idolatria. É possível compreender esse preceito ao considerarmos que o povo eleito era anterior ao regime da Encarnação.

Mais perto da nossa época, o filósofo cristão dinamarquês Soren Kierkegaard (1813-1855) declarou humildemente: “Frequentemente eu me perguntei como um artista plástico deveria representar a misericórdia; mas reconheci a impossibilidade disso”.13

De fato, tanto para o artista quanto para o monge, a verdadeira arte sagrada é como o pórtico de entrada para adentrar no mistério divino. Por isso, como Moisés teve que tirar as sandálias dos pés para caminhar na Terra Santa (cf. Ex 3, 5), o artista sagrado, como o monge, deve deixar a imanência de suas emoções e inclinações pessoais para entrar em Cristo, para viver com Cristo e reconhecer a voz do Verbo que se fez carne. O sagrado torna-se arte e a arte se torna sagrada e consagrada à glória de Deus.

Assim a escrita do ícone (ou imagem, “eikon” em grego) como qualquer obra de arte sacra, nasce tanto da oração e do jejum, quanto do trabalho da técnica pura (muito necessário, contudo).

São João Paulo II, no seu amor pelo Oriente, não hesita em comunicar sua convicção:

[...] em determinado sentido, o ícone é um sacramento: com efeito, de modo análogo ao que sucede nos sacramentos, ele torna presente o mistério da Encarnação nalgum dos seus aspectos.”14

É uma questão de passar pela metanoia que me destitui do culto do “eu e de sua centralização”, para passar à contemplação de Deus, o outro além de mim mesmo, para abrir-me aos outros (os outros além de mim mesmo) e ao mundo. Pois a arte sacra não se fabrica e seria uma usurpação enganosa procurar “um fazer religioso” ou “um fazer cristão”. Deve-se notar que o ícone, assim como a Liturgia, é fruto de uma elaboração secular, que tem sido progressivamente especificada e formada dentro da Tradição, de acordo com um conteúdo e uma estrutura, bem objetivos, que não podem ser simplesmente entregues à arbitrariedade de cada um. Neste sentido, não podemos falar de “ícones modernos”.

O ícone é a “epifania dos rostos”, através da Face visível do Deus invisível. Aquele que entrou plenamente na Luz de Sua Ressurreição é contemplado no Ícone e é Ele que atrai os santos e os fiéis para essa mesma luz.

É por isso que a transparência deve certamente se tornar uma das virtudes do artista, como o vidro que conduz e transmite a luz, mas nunca a retém para si mesmo. É assim que uma comunidade que reza, celebra e canta sua liturgia, transmite uma graça única que não pode ser transferida ou imitada, como para cada mosteiro beneditino ou bizantino. É o que acontece também em relação a uma Catedral ou um lugar de peregrinação, estes são lugares sagrados e artísticos porque deixam uma marca de acordo com sua graça que é única.

Em um mundo invadido por imagens de todo tipo: violentas, eróticas, comerciais... distribuídas aos olhos de todos para provocar o consumo, seduzir ou atrair. Mas por detrás desta aparência superficial, só Deus sabe quão profundo é o poço da sede humana! Como se pergunta o Cardeal Arcebispo de Viena, Christophe Schönborn: “Não há uma sede crescente pela imagem pura, a imagem santa, a imagem que suscita a compaixão, a alegria, que eleva o coração para o Amor de Deus e que nos sensibiliza a verdadeira beleza, a de Deus e de sua criação? Sede da imagem do Alto, na escuta e no acolhimento do que Deus diz e dá ao homem.”15

A “Ecclesia de caritate (Igreja do Amor)” testemunha da beleza de Cristo

A lâmpada do corpo é o olho. Portanto, se teu olho estiver são, todo o teu corpo ficará iluminado; mas se teu olho estiver doente, todo o teu corpo ficará escuro. Pois se a luz que há em ti são trevas, quão grandes serão as trevas!”(Mt 6, 22-23)

O documento do Pontifício Conselho da Cultura desenvolve outra dimensão importante, a da “Beleza da Caridade”, da qual a Igreja dá testemunho.Onde a caridade brilha, aí se manifesta a beleza que salva, ali cresce a unidade e a comunhão dos discípulos de Nosso Senhor.

A Ecclesia de caritate se revela como a Esposa, embelezada por seu Senhor quando realiza seus atos de caridade e suas escolhas preferenciais, quando se compromete com a justiça e com a edificação da grande casa comum na qual toda criatura é chamada a habitar, especialmente os pobres: eles também têm direito à beleza.”16

O Pontifício Conselho para a Cultura incentiva o diálogo com os artistas, os pintores, os escultores, os arquitetos de igrejas, os restauradores, os músicos, os poetas, os dramaturgos etc., a fim de inspirar sua imaginação nas fontes da fé e trabalhar na organização de eventos culturais e artísticos, exposições, festivais, concertos, conferências etc., com o objetivo de valorizar o imenso patrimônio da Igreja e fomentar uma nova criatividade, especialmente nos campos da arte e do canto litúrgicos.

Novas epifanias da beleza, nascidas da contemplação de Cristo, Deus feito Homem, da meditação de seus mistérios, de sua irradiação na vida da Virgem Maria e dos santos.”17

A Imaculada Conceição como a primeira obra de beleza na Criação Renovada

A insistência no fato de que existe uma grande multiplicidade de representações da Virgem Maria, tanto na iconografia como nas pinturas sagradas ao longo dos séculos, marca a importância desta jovem escolhida pelo Senhor, “mais venerável que os Querubins e incomparavelmente mais gloriosa que os Serafins”, como canta a liturgia bizantina. A nova Arca da Aliança e o Templo vivo. Através de Maria o Verbo se encarna.

No momento da Anunciação, a Encarnação do Verbo é revestida de uma dimensão cósmica, já que o Eterno entra no tempo, o Infinito no finito. Sem qualquer semente humana, a Virgem Maria concebe pelo Espírito Santo o Messias, o Ungido do Pai, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade. A Virgem Maria é reconhecida como a nova Eva, a nova sarça ardente e o lugar da Nova Aliança, através da qual Deus assume nossa humanidade, ela torna-se a Mãe de Deus, abençoada entre todas as mulheres.

Se a beleza do Filho é a fonte de toda beleza renovada, a Imaculada Conceição é certamente a primeira “obra de beleza”. A Virgem Maria e os santos que a seguem são os reflexos e as testemunhas luminosas da beleza de Cristo, a beleza do infinito Amor de Deus dado e comunicado à humanidade.

Como as facetas de um único diamante, os santos refletem a luz, a santidade e a beleza original do Deus de Amor. A Imaculada, a Amada do Cântico dos Cânticos, é reconhecida pelo Arcanjo na manhã da Anunciação como “a Cheia de Graça”, o que pode ser traduzido como “graciosa”, ou seja, “a plenitude da beleza”.

A Exortação Apostólica Vita Consecrata de São João Paulo II, reconhece particularmente nos consagrados esta obra particular de beleza divina: “Mas é sobretudo a vós, mulheres e homens consagrados, que no final desta Exortação dirijo o meu apelo confiante: vivei plenamente a vossa dedicação a Deus, para não deixar faltar a este mundo um raio da beleza divina que ilumine o caminho da existência humana. Os cristãos, imersos nas lides e preocupações deste mundo mas chamados eles também à santidade, têm necessidade de encontrar em vós corações puros que, na fé, ‘veem’ a Deus, pessoas dóceis à ação do Espírito Santo que caminham diligentes na fidelidade ao carisma da sua vocação e missão.”18

Assim, no decorrer dos tempos e da história, se cumpre a profecia inspirada em Maria no seu Magnificat: “Todas as gerações me chamarão bem-aventurada” (Lc 1, 48). Na verdade, todos os Santos e Papas, incluindo o Papa Francisco, reconheceram em Maria esta plenitude de graça.

Oração do Papa Francisco: Toda sois Formosa, ó Maria!

A Oração do Papa Francisco à Imaculada Conceição, “Toda sois Formosa, ó Maria!” inspirada no latim “Tota pulchra es Maria”, foi pronunciada pelo Papa na Solenidade da Imaculada Conceição da Bem-aventurada Virgem Maria no domingo, 08 de dezembro de 2013, na Praça de Espanha aos pés da Coluna da Virgem Maria em Roma.

“Toda sois Formosa, ó Maria! Em Vós não há pecado. Suscitai em todos nós um renovado desejo de santidade: na nossa palavra, refulja o esplendor da verdade, nas nossas obras, ressoe o cântico da caridade, no nosso corpo e no nosso coração, habitem pureza e castidade, na nossa vida, se torne presente toda a beleza do Evangelho. Toda sois Formosa, ó Maria! em Vós Se fez carne a Palavra de Deus. Ajudai-nos a permanecer numa escuta atenta da voz do Senhor: o grito dos pobres nunca nos deixe indiferentes, o sofrimento dos doentes e de quem passa necessidade não nos encontre distraídos, a solidão dos idosos e a fragilidade das crianças nos comovam, cada vida humana sempre seja, por todos nós, amada e venerada. Toda sois Formosa, ó Maria! Em Vós, está a alegria plena da vida beatífica com Deus. Fazei que não percamos o significado do nosso caminho terreno: a luz terna da fé ilumine os nossos dias, a força consoladora da esperança oriente os nossos passos, o calor contagiante do amor anime o nosso coração, os olhos de todos nós se mantenham bem fixos em Deus, onde está a verdadeira alegria. Toda sois Formosa, ó Maria! Ouvi a nossa oração, atendei a nossa súplica: esteja em nós a beleza do amor misericordioso de Deus em Jesus, seja esta beleza divina a salvar-nos a nós, à nossa cidade, ao mundo inteiro. Amém.” 19

Referências:

1 Joseph Ratzinger, Eucharistie et mission, dans Liturgie et Mission (Eucaristia e Missão, em Liturgia e Missão), Centro Internacional de Estudos Litúrgicos, Paris, 2002.

2 René Rémond, Le Christianisme en accusation, Paris 2000; Le nouvel antichristianisme, ibid., 2005. Citado por Conselho Pontifício para a Cultura, A Via pulchritudinis, caminho privilegiado de evangelização e de diálogo. Documento final da Assembleia Plenária, 2006.

3 Max Jacob, citado por Conselho Pontifício para a Cultura, A Via pulchritudinis, caminho privilegiado de evangelização e de diálogo. Documento final da Assembleia Plenária, 2006.

4 Papa São João Paulo II, Carta Apostólica Novo Millennio Inuente, n. 16.

5 Conselho Pontifício para a Cultura, A Via pulchritudinis, caminho privilegiado de evangelização e de diálogo. Documento final da Assembleia Plenária, 2006.

6 Papa São João Paulo II, Carta Apostólica Novo Millennio Inuente, n. 25.

 7 Ibidem, n. 26.

 8 Ibidem, n. 28.

 9 Ibidem, n. 19.  

10 Ibidem,

11 Santo Agostinho, Confissões, Livro X, 38.

12 Conselho Pontifício para a Cultura, A Via pulchritudinis, caminho privilegiado de evangelização e de diálogo. Documento final da Assembleia Plenária, 2006.

 13 Soren Kierkegaard, As Obras do Amor, segunda série, VII. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 335.

 14 Papa São João Paulo II, Carta aos Artistas (1999), n. 8.

 15 L’Osservatore Romano, artigo sobre O Ícone do Verbo Encarnado, edição francesa, n. 15, 12 de abril de 1988.

 16 Conselho Pontifício para a Cultura, A Via pulchritudinis, caminho privilegiado de evangelização e de diálogo. Documento final da Assembleia Plenária, 2006.

 17 Conselho Pontifício da Cultura, Documento “Por uma pastoral da cultura”, n. 36.

 18 Papa São João Paulo II, Exortação Apostólica Vita Consecrata (1996), n. 109.

 19 Papa Francisco, Ato de veneração à Imaculada Conceição na praça Espanha, 8 de dezembro de 2018.